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quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Bulimia: um pouco de informações.




A primeira descrição de bulimia nervosa foi elaborada por Russel1, em 1979, quando descreveu os casos de 30 pacientes com peso normal, medo intenso de engordar, episódios de compulsão alimentar periódica repetidos e atos purgativos consequentes, nomeadamente o vômito autoinduzido.

Nessa primeira descrição, Russel considerava ainda a bulimia nervosa como uma variação da anorexia nervosa. Contudo, em 1991, Fairburn assumiu esse transtorno de forma autônoma, verificando que apenas de 20% a 30% das pacientes bulímicas apresentavam uma história progressiva de anorexia nervosa, em geral de curta duração.

Poucos anos mais tarde, e sensível a inúmeros estudos epidemiológicos, a American Psychiatric Association incorporou, na IV edição do Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais, uma nova seção ao espectro dos transtornos alimentares, a EDNOS (Eating Disorders Not Otherwise Specified), na qual se integra o transtorno da compulsão alimentar periódica.

Como principal característica do transtorno da compulsão alimentar periódica encontra-se a ingestão repetida de grande quantidade de alimentos (binge), acompanhada pela sensação de perda de controle sobre o ato de comer. Associada a essa compulsão alimentar periódica, surge a sensação de mal-estar significativo, distress e, de acordo com estudos empíricos, aumento significativo de peso, obesidade e alta comorbilidade com outros transtornos psicológicos.

Por seu turno, os indivíduos identificados com bulimia nervosa, apesar de partilharem do critério de compulsão alimentar periódica com o transtorno anterior, apresentam ainda métodos compensatórios recorrentes, com o intuito de prevenir o aumento de peso: uso de laxantes, vômito, recursos diuréticos ou exercício físico exagerado.

Estudos epidemiológicos demonstram que os transtornos alimentares (anorexia nervosa, bulimia nervosa e suas variantes) são quadros psiquiátricos que têm impacto principalmente em adolescentes e jovens adultos do sexo feminino, levando a prejuízos biopsicossociais significativos e com elevadas taxas de mortalidade e morbilidade.

Os mesmos estudos demonstram consistentemente que de 1% a 3% de adolescentes do sexo feminino apresentam diagnóstico - ou comportamentos suscetíveis de diagnóstico - de bulimia nervosa; estima-se que 1% da população geral preencha critérios para um transtorno da compulsão alimentar periódica.

Para dar resposta a esses valores e às consequências físicas, psicológicas e sociais desses transtornos, foram desenhadas inúmeras psicoterapias e diversos estudos relativos à sua eficácia. Chen e Linehan, apoiando-se, sobretudo, nos dados que informam que os atuais tratamentos para a bulimia nervosa e para o transtorno da compulsão alimentar periódica são eficazes, a longo prazo, em apenas 50% dos pacientes com esses transtornos, defendem o desenvolvimento de uma Terapia Comportamental Dialética para esses transtornos.

Os mesmos autores insistem ainda no recurso dessa terapia para esse tipo específico de paciente, pelo fato de esses transtornos envolverem dificuldades na regulação afetiva e por esses indivíduos apresentarem escassas competências nessa área, apesar da "aparente competência" em outras áreas da sua vida, dimensões pouco exploradas por outras terapias de relativa eficácia.

A terapia comportamental dialética (TCD) assenta em princípios cognitivo-comportamentais multimodais e foi originalmente desenhada para o tratamento do transtorno de personalidade borderline, sendo a sua aplicação terapêutica conduzida sob a alçada de uma epistemologia (ramo da filosofia que trata dos problemas filosóficos relacionados com a crença e o conhecimento) dialética e as estratégias aplicadas de cariz comportamental.

Atualmente, a American Psychiatric Association assume a TCD como o tratamento de regulação afectiva mais eficaz e empiricamente suportado para esse tipo de transtorno.

A lógica dialética nesse transtorno envolve a aceitação dos pacientes nas suas atuais dificuldades - por exemplo, pelo recurso a estratégias como o mindfullness (algo como "preenchimento da mente"), ao mesmo tempo que faz uso das suas competências para a modificação dos comportamentos desajustados - por meio de um componente didático, análise metódica e interativa das cadeias comportamentais, entre outras estratégias comportamentais.

Apesar de inicialmente ter sido desenvolvida para subgrupos específicos de pacientes com transtorno de personalidade borderline (por exemplo, pacientes com risco acrescido de comportamentos suicidas ou dependentes de substâncias), estudos recentes demonstram a eficácia da TCD para populações diagnosticadas com transtorno de personalidade borderline comórbidas a perturbações alimentares ou com um diagnóstico único de transtorno alimentar em adultos ou adolescentes, ou para outras populações sem diagnóstico no eixo II25-27 (referente ao código internacional de doenças).

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