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sexta-feira, 28 de junho de 2013

Importação de Médicos Estrangeiros


Há cerca de sete anos eu me interessei em migrar para o Canadá, como médico.

Há uma espécie de "oferta" de vagas para médicos de alguns países (não todos) para que migrem para lá, em função da falta (real) de profissionais para dar conta de atender a população de cerca de 35 milhões de pessoas, de acordo com estimativas de 2010, espalhada por quase 10 milhões de Km quadrados, mas concentrada em lugares mais populosos em função das características geográficas daquele País, que se estende do Atlântico ao Pacífico e tem muitas etnias encontradas em dez províncias e três territórios, no segundo maior País do Mundo.

Eu dei início à minha investida e me deparei com um rigoroso mecanismo de avaliação quanto a questões completamente pertinentes para que um médico possa atuar em território canadense, já que, como todos sabem, médicos lidam com vidas e precisam estar devidamente preparados para socorrer e preservar as vidas das quais ele venha a cuidar.

É necessário uma avaliação da capacidade de comunicação, aferida pelo conhecimento de uma das duas línguas oficiais do Canadá: inglês ou francês. Neste caso é fundamental a absoluta fluência, evidentemente.

Da mesma maneira é necessária a absoluta fluência em... Medicina! Óbvio!

Assim, apto para exercer suas tarefas como Médico de Família, responsável por um determinado número de famílias (pessoas) em uma determinada área, o médico, após passar por todas as provas necessárias para comprovar suas capacidades e habilidades, processo que dura cerca de um ano, ainda há a necessidade de um período de adaptação, que ainda tem características probatórias, o Médico poderá iniciar seu exercício em território Canadense.

E isto acontece com o recebimento, por parte do Médico, de um salário DIGNO, em moeda local, dólares canadenses.

Normalmente, tais profissionais ficam responsáveis por aquilo que chamamos de atendimento primário à população.

Evidente que há casos de profissionais que migram para lá visando o campo de pesquisas ou investigação científica, como em qualquer lugar do Planeta, até mesmo no Brasil (!), como pude presenciar na UNIFESP.

Mas, aí não é o caso para se comparar com qualquer traço de "importação de médicos", como querem fazer aqui, em nosso País!

Citei o caso de minha pequena e frustrada experiência com o Canadá, já que desisti, por uma série de fatores de cunho pessoal, apenas para recordar que um País sério aceita, sim, qualquer profissional de outro País para trabalhar em suas fronteiras.

Isso é evidente e necessário em vários casos!

Mas, por ser sério, o País, a Nação, faz uma seleção extremamente minuciosa de quem irá poder trabalhar com sua população.

E nesta seleção estão incluídas as avaliações de conhecimento técnico e linguístico apurados, além da adequação efetiva para a realidade do próprio País, sem o que não é possível exercer a medicina com correção sem colocar em risco a vida humana.

Isto, apenas isto, é o mínimo para começar a pensar em colocar Médicos estrangeiros aqui, em nosso País.

Não adianta arrebanhar profissionais, como se fosse desesperadora a situação de "falta de médicos" no Brasil e disparar para as regiões mais remotas tais colegas de profissão, para "salvar a Pátria" em função de ausência de médicos (sic) em tais localidades. Parece-me uma atitude populista (posso estar enganado?)

O que tem sido veiculado é que virão Médicos que não serão submetidos às necessárias provas de avaliação REGULAMENTADAS PELO PRÓPRIO GOVERNO para o "trabalho de campo" (esta expressão é minha, mesmo!).

O buraco da Saúde, assim como o da Educação, é muito, mas muito mais fundo do que simplesmente, como se fosse regime de guerra, cobrir espaçoes com Médicos de fora do País.

Li uma série enorme de dados estatísticos, a partir de estudos sérios do Conselho Federal de Medicina (CFM) e outras Instituições que SÃO SÉRIAS efetivamente, que demonstram que não faltam médicos no País!

Na expressão do CFM: "A noção de que faltam médicos no Brasil parece orientar o diagnóstico de algumas autoridades públicas responsáveis pelas políticas de saúde".

E, ainda: "A carência ou ausência de médicos nos serviços públicos têm sido apontadas como os principais problemas da saúde em diversas pesquisas de opinião".

E mais: esta história de "importar médicos cubanos" não é nova!

Mas, quando se fala de carência de médicos, temos de analisar o problema com lupas ou microscópios, ou, talvez, com lunetas ou telescópios. É tudo questão de pontos de vista!

É assim: Médicos NÃO TRABALHAM SOZINHOS! Eles precisam de para-médicos, de uma equipe de profissionais em conjunto com eles para que a Saúde funcione! (Nem por isso sou contra o "Ato Médico": sou a favor, que ninguém me escute!)

Então, só para começar, se "alguém" pretende colocar médicos nos recônditos espaços vazios de médicos do mapa do Brasil, precisará colocar, também, enfermeiros(as)- [entenda-se auxiliares e etc], fisioterapeutas, biomédicos, técnicos de RX, de laboratório, pessoal administrativo (pelo menos o básico) e a estrutura física, que inclui construções adequadas, laboratórios, ambulatórios, hospitais para atendimento secundário, etc, etc, etc e tal!

Tudo bem! Você, é você mesmo! Você quer colocar mais médicos onde? Em São Paulo, em Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Vitória, Salvador, Porto Alegra, Fortaleza, Manaus, Recife, Florianópolis, onde afinal?

Pois saiba que estas capitais TODAS têm, de acordo com o CFM "taxa de dois médicos por 1.000 habitantes", que é um número respeitável, diante, inclusive da Organização Mundial de Saúde na relação médico/população.

Estas capitais NÃO PRECISAM DE MAIS MÉDICOS!

Então, por qual razão você é atendido de forma inadequada no SUS ou mesmo no seu Convênio? Por qual razão você espera duas, três, quatro, cinco, seis horas em um pronto-socorro?

Eu falei: o buraco é MUITO MAIS FUNDO!

Mas, acredite: não é por falta de médicos!

É por erro de estrutura! E isso pode gerar um debate de dias, semanas ou mesmo meses e anos, pois a estrutura está completamente corroída e não é de agora!

Em 1976, quando eu comecei meu curso de Medicina, escutei um "profeta" (desculpe a brincadeira, caro Doutor!) chamado Gonçalo Vecina Neto, que, no mesmo ano cursava o sexto ano de medicina, na mesma Faculdade que eu dizendo em uma assembléia de alunos, que a Medicina estava sendo sucateada por grupos médicos!

Eu achei aquilo muito, mas muito interessante, tanto que está gravado em minha mente e carrego comigo esta opinião que, pelo menos naquele momento político (lembram da ditadura, repressão e coisa e tal? então, eu sou daquela época!) representava a extração de recursos médicos, de capital mesmo, de dinheiro - falando mais claramente - para um grupo de médicos (ou não) empresários que dominavam (e dominam) a medicina no País, explorando médicos e pessoal paramédico de modo geral.

Nossa! Então o problema é antigo? Isso, mesmo! Já existe há muito, mas muito tempo!

A desestruturação da Saúde e da Educação em nosso País vem de épocas imperiais! Sempre foram deixadas para segundo, terceiro ou quarto planos de importância! E não me digam que algo de CONCRETO foi feito, pois não há sustentação para que eu acredite nisso!

As lutas de muitos médicos sanitaristas (Osvaldo Cruz e Carlos Chagas devem ser citados) para institucionalizar a Saúde como prioridade no Brasil são dignos exemplos de idealistas que fizeram enorme esforço para que o POVO recebesse algo de melhor em termos de PREVENÇÃO e de atendimento dígno, que é, no final das contas o mais importante para a vida de todos nós. Mas...

Bom eu falei de CAPITAIS! Elas têm uma estrutura relativamente bem definida, para quem se colocar a observar um pouco que seja.

Veja só: o SUS (rede pública), os Grupos Médicos (rede conveniada) e a estrutura de atendimento particular.

Fica claro que o SUS é para "todos" - é a medicina para o povo e a ideia é fantasticamente correta, iniciada por um idealista, que deu à luz uma estrutura que seria financiada pela CPMF (lembra dela?: A Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira - uma "contribuição" destinada especificamente ao custeio da saúde pública, da previdência social e do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza), Dr. Adib Jatene.

Mas, idelismos, neste Planeta, são fadados ás decepções, veja:

Quando perguntado se sua saída do Governo FHC teve relação com a CPMF, Jatene respondeu:

“Teve relação direta. Eu disse ao presidente Fernando Henrique que precisava de recursos. Ele pediu para falar com o Pedro Malan [ministro da Fazenda]. O Malan me disse que, em dois ou três anos, daria o dinheiro que eu precisava. Não podia esperar tanto tempo. Propus a volta do imposto sobre o cheque, que se chamava IPMF e havia sido extinto em 94. O presidente disse: ‘Você não vai conseguir aprovar isso.’ Respondi: Posso tentar? Ele autorizou. Pedi o compromisso dele de que o orçamento da Saúde não seria reduzido. A CPMF entraria como o adicional. E ele: ‘Isso eu posso te garantir’. Depois da aprovação, a Fazenda reduziu o meu orçamento. Voltei ao presidente. Disse: no Congresso, me diziam que isso ia acontecer. Eu respondia que não, porque tinha a sua palavra. Se o senhor não consegue manter a sua palavra, entendo a sua dificuldade. Mas me faça um favor. Ponha outro no meu lugar. Foi assim que eu saí, em novembro de 96."
(fonte: wikipedia)

Como se pode ver, a Saúde NÃO É UMA DAS PRIORIDADES DESTE PAÍS! Em todas as gestões fica para um plano inferior de importância. A CPMF caiu, por força das pressões populares, em 2007 (lembra?).

Eu não acho que a CPMF seria a "salvação" para a Saúde! Acredito que não é preciso criar mais um imposto (contribuição) para que a Saúde receba recursos financeiros em um País tão rico. Acredito que é IMINENTE acabar com a corrupção! Isso devolveria rios de dinheiro para os dois setores mais importantes de uma sociedade Saúde e Educação.

Aliás gosto desta frase: "Pago impostos o tempo todo e o Governo ainda me chama de contribuinte."

Fica claro, também, que Grupos Médicos servem, sim, a um enorme número de pessoas que PAGAM, todos os meses, para ter alguma segurança em níveis ambulatorial, hospitalar e laboratorial. De acordo com o IBGE, "calcula-se que 25,7% das mulheres e 23,0% dos homens brasileiros estejam cobertos por um plano de saúde". é um número de pessoas expressivamente grande, cerca de quarenta por cento da população está "protegida" por um seguro saúde ou um convênio médico.

Estas pessoas deveriam estar satisfeitas com a "proteção" que os grupo médicos oferecem, mas como em todos os casos da Vida, nem todos ficam satisfeitos ou contentes com o serviço! Há quem "passeie por vários médicos ou hospitais" sem que sejam adequadamente atendidos e ficam, certamente decepcionados! Qual a razão? Há muitas possibilidades e, só para citar exemplo, despreparo profissional, falta de condições de trabalho, baixa remuneração (ah, eu não tinha dito ainda: médicos e para-médicos são, na maioria das vezes pouco remunerados pelos seus serviços, o que constitui, em minha opinião UMA VERGONHA [desculpe, Boris Casoi, pela apropriação de seu jargão!]). Mas, estou citando apenas uma parcela bem pequena dos problemas que existem numa estrutura altamente complexa e, em alguns casos defesada...

Há, ainda o atendimento privado. Esta parcela pequena de estrutura atende "privilegiados" ou pessoas que muitas vezes fazem sacrifícios para serem atendidas por um médico de confiança. É falível como é qualquer estrutura, mas certamente dá uma assistência de qualidade teoricamente superior para quem a procure e não se restringe a serviços estéticos, como gostam de afirmar algumas pessoas que não compreendem bem este setor.

Só que este setor realmente não necessita ser foco de nossa análise.

O que resta para pensar e refletir (de verdade) são os dois primeiros.

O que falta para o SUS funcionar? RECURSOS DE VERDADE! E neste quesito devem ser consideradas uma bela série de fatores, como estrurura dos atendimentos primário (ambulatório, medicina familiar, laboratórios descentralizados, etc), secundários (hospitais gerais e estruturas paralelas a eles) e terciário (hospitais de especialidades - gineco, obstetrícia, cardio, ortopedia, traumato, oftalmo, etc e tal).

Pois é: dê uma "voltinha" por aí e veja a estrutura da esmagadora maioria das Unidades de Saúde, dos laboratórios, centros de atendimento em fisioterapia, atendimentos a pacientes psiquiátricos, enfim, todos os Aparelhos Públicos e constate com seus olhos e ouvidos se tudo é tão bonitinho como mostram as propagandas na TV.

Faça isso nas capitais! Depois, por sugestão, vá às cidades menores e verifique as mesmas coisas.

Por fim, se quiser e puder, claro, vá ao "fim do mundo" das cidades e localidades mais perdidas por aí, para ver como são literalmente sucateadas as Unidades de Atendimento.

Mas, quando falo de "fim do mundo" não estou me referindo ao Alto Araguaia, nem mesmo às Aldeias Ribeirinhas do Amazonas e Afluentes! falo do interior de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina...

Veja lá, se tem equipamentos e condições para trabalhar com dignidade, por favor!

E, se não tem nesses locais, imagine no Alto Araguaia ou nas regiões mais "afastadas" do Amazonas, Pará, etc...

Já que você vai, aproveite para questionar quem se aventure a trabalhar nestas bandas, feito heróis e heroínas, quanto eles recebem pelo seu trabalho!

Pergunte para os médicos, já que você se arriscará a ir, quanto eles recebem pelos seus trabalhos.

Aí pergunte a si mesmo: será que eu mesmo conseguiria me submeter a trabalhar em condições tão "favoráveis" assim?

Assim você pode entender a razão pela qual muitos médicos têm a preferência de se instalar em grandes centros urbanos, apesar das dificuldades encontradas também neles.

Há muito mais a ser escrito, dito, discutido, refletido, embalado em sonhos, mas, só para ilustrar diferenças, leia como são curiosas as difenrenças entre as estruturas do Brasil e Cuba, num trecho de um texto da Folha de São Paulo, de Patrick Symmes: "Em Cuba, o salário médio é de US$ 20. Médicos chegam a ganhar US$ 30, e muitas outras pessoas ganham só US$ 10."

Pois é... talvez seja pior do que aqui...

Veja mais uma coisa curiosa, extraída da Folha de São Paulo (por coincidência), num depoimento à repórter Cyneida Correia: "Nascido e formado em Cuba, Josué Jesús Matos, 46, chegou ao Brasil em 1997, num dos primeiros grupos de médicos cubanos que trabalharam no país. Matos atuou no interior de Roraima, se casou e voltou a Cuba com a mulher brasileira. Depois de pouco tempo na ilha, retornou ao Brasil e foi eleito prefeito de Mucajaí (a 60 km de Boa Vista)."

Interessante, não é mesmo?

Então: vamos pensando! Será que é disso, mesmo, que o Brasil precisa?

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