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terça-feira, 9 de agosto de 2011

Comer Muito Hipóteses das Causas





Os Transtornos Alimentares têm causas múltiplas, envolvendo, como quase sempre na psiquiatria, as predisposições genéticas e constitucionais, as influências socioculturais e as vulnerabilidades psicológicas pessoais. Essas são as condições que poderíamos colocar a Compulsão Alimentar Periódica.

Entre os fatores genéticos predisponentes, destaca-se a história de transtorno alimentar e (ou) transtorno do humor na família (transtorno de ansiedade, depressão). Entre portadores de Compulsão Alimentar Periódica é comum existirem parentes de primeiro grau também com transtorno alimentar ou quadros depressivo-ansiosos.

Os fatores sócio-culturais têm início nos padrões de relacionamento no ambiente familiar. Há em nossa sociedade, e também na maioria dos ambientes familiares, extrema valorização da estética corporal, do corpo magro (veja Tirania do Corpo), atribuindo grande culpa para a pessoa que não se encaixa no modelo estético desejável culturalmente.

A cobrança exagerada para o controle alimentar por parte dos familiares, a vigilância insistente sobre a dieta, críticas pretensamente construtivas, comparações maldosas com pessoas “esbeltas e elegantes” muitas vezes acabam causando efeito contrário do que esperavam esses familiares, ou seja, a pessoa vigiada acaba desenvolvendo algum transtorno alimentar e, entre eles, com muita freqüência a Compulsão Alimentar Periódica.

As vulnerabilidades pessoais dizem respeito a determinados traços de personalidade, à fragilidades emocionais pessoais decorrentes de eventos vitais significativos e, biologicamente, a disfunções no metabolismo das monoaminas centrais, notadamente serotonina, noradrenalina e dopamina. Entre os traços de personalidade destaca-se o tipo de relacionamento sujeito-objeto (sujeito-comida), tais como as características de avidez, de busca continuada de saciedade, da incapacidade de protelação do prazer, entre outros.

Considerações de Classificação

Mais recentemente a psiquiatria preocupou-se, como sempre e mais ou menos indevidamente, com a tarefa de classificar esse sintoma, dando a capciosa idéia de doença. Na descrição dos quadros psiquiátricos oDSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 4th. Edition), refere o Episódio de Compulsão Alimentar como um dos componentes principais da Bulimia Nervosa. Este Episódio de Compulsão Alimentar, como vimos, é também a característica principal do denominado Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica.

Assim, dentro do espírito classificatório dos manuais de psiquiatria a Compulsão Alimentar Periódica seria um Transtorno Alimentar sem Outra Especificação.

O sintoma de comer exageradamente (hiperfagia) acontece em outros quadros além da Bulimia e da Compulsão Alimentar Periódica. Alguns transtornos depressivos com características atípicas, e normalmente de grau grave, podem determinar o aparecimento de episódios de hiperfagia, resultando em grande variação no peso da pessoa. Chega a 50% a concomitância da Compulsão Alimentar Periódica com depressão (Borges, 2000). Nestes casos também as pessoas não têm o impulso de vomitar depois do ato de comer exageradamente, como acontece na Bulimia.

Por outro lado, também é bastante sensato considerar esse descontrole do impulso de comer como mais um tipo de Transtorno do Controle dos Impulsos.

Os psiquiatras, entretanto, já se acostumaram a ver sintomas psiquiátricos se transformarem em doenças psiquiátricas nas classificações internacionais. Entretanto, até agora, a grande maioria dos diagnósticos psiquiátricos contemporâneos ainda não foi descrita como categorias válidas de doenças, por si mesmas. Seria como, por exemplo, considerar-se a embriaguez como vários estados patológicos; uma doença caracterizada por tontura após a ingestão de álcool, outra por enjôo, outra por euforia, sonolência, irritabilidade, e assim por diante. São todos sintomas particularizados em cada pessoa de um mesmo estado: a embriaguez.

Alguns autores têm, sabiamente, proposto a inclusão da Compulsão Alimentar Periódica dentro do espectro obsessivo-compulsivo (McElroy, 2000 Aqui o sintoma chave seria a preocupação persistente sobre o peso, e o desejo de comer em excesso ocorreria de maneira incontrolável e egodistônica, ou seja, casando absoluta desaprovação e angústia no paciente, tal como acontece Transtorno Obsessivo-Compulasivo (TOC). Com esse raciocínio, o episódio de compulsão alimentar corresponderia ao ato compulsivo do TOC.

Compulsão Alimentar Periódica e a Síndrome do Comer Noturno

Stunkar, na década de 1950 descreveu um transtorno alimentar-comportamental caracterizado por três componentes principais: pouco apetite de manhã, comer excessivamente à tardinha ou à noite e insônia. Stunkard observou também que a Síndrome do Comer Noturno tendia a ser desencadeada pelo estresse e que seus sintomas diminuíam quando o estresse era aliviado.

Em estudos posteriores e muito detalhados (Birketvedt et al, 1999) mostraram que a Síndrome do Comer Noturno aparece em 10% das pessoas que se tratam de obesidade e em 27% daquelas submetidas à cirurgia para obesidade.

Os episódios compulsivos de comer (Binge Eating) aparecem apenas na Compulsão Alimentar Periódica e não na Síndrome do Comer Noturno. Estes episódios de Binge Eating não são motivados apenas uma fome fisicamente determinada, mas por um impulso irrefreável de ingerir comida em grande quantidade. Pode se comer tudo que estiver disponível, durante esses episódios, mesmo sem tomar o paladar como critério, ou seja, são ingeridas comidas frias, alimentos doces misturados com salgados, alimentos vencidos, e assim por diante. O que interessa mesmo é a quantidade.

A Síndrome do Comer Noturno, por sua vez, se manifesta por comer excessivamente à tardinha ou à noite, mas não compulsivamente, apenas por aumento da vontade de comer. Entre as pessoas que sofrem de Compulsão Alimentar Periódica, 15% delas tem, concomitantemente, a Síndrome do Comer Noturno.

Um dado interessante na Síndrome do Comer Noturno é que, em média, esses pacientes consumem 56% de toda sua ingestão calórica diária no período noturno, entre as 22 e 6 horas, ao passo que a população geral consume aproximadamente apenas 15% da ingestão calórica diária nesse período.
Uma das características da Síndrome do Comer Noturno é sua associação com a obesidade, depressão, baixa auto-estima e diminuição da fome diurna. Os pacientes obesos com Síndrome do Comer Noturno têm menos êxito nos programas de redução de peso do que pacientes obesos sem a Síndrome do Comer Noturno.

Prevalência

Na população geral a prevalência de Compulsão Alimentar Periódica é em torno de 1,5%, porém, entre os pacientes obesos essa prevalência é bem maior, até 30%.

Tratamento

O tratamento para a Compulsão Alimentar Periódica é múltiplo, devendo envolver o uso de medicamentos, intervenções psicológicas e nutricionais.

De uma maneira geral, três classes de medicamentos têm sido estudadas em ensaios controlados com placebo em pacientes com Compulsão Alimentar Periódica. Os antidepressivos, particularmente os inibidores seletivos de recaptação da serotonina (ISRS) são uma classe farmacológica bastante estudada para esta condição.

Assim sendo, o tratamento farmacológico para esse transtorno deve começar com um antidepressivo inibidor seletivo da recaptação da serotonina, como por exemplo, a fluoxetina, fluvoxamina, sertralina e o citalopram têm sido capazes de reduzir significativamente o comportamento de compulsão alimentar e o peso.

As doses desses antidepressivos devem ser as mesmas utilizadas no tratamento da bulimia nervosa e da depressão maior, levando-se em consideração que, para pacientes bulímicas, existem diferenças significativas para melhor, sobre a compulsão alimentar, quando se utiliza 60 mg diários ao invés dos tradicionais 20 mg.

Ultimamente a sibutramina, uma substância utilizada em programas de perda de peso por aumentar a sensação de saciedade parece ter importante papel no tratamento da Compulsão Alimentar Periódica , assim como os anti-impulsivos (Estabilizadores do Humor), representados na psiquiatria pelos anticonvulsivantes, tais como oxcarbazepina, topiramatos, lamotrigina, ácido valpróico ou divalproato de sódio que também são bastante úteis neste tratamento.

Uma curiosidade no tratamento da Compulsão Alimentar Periódica observada nos primeiros estudos, foi a forte resposta ao placebo nestes pacientes. Mas esta alta resposta, entretanto, não é um fenômeno exclusivo da Compulsão Alimentar Periódica. Ela é característica de grande parte dos transtornos psiquiátricos, como é o caso, por exemplo, da Fobia Social.

Em relação ao tempo de tratamento, não existem estudos que estabeleçam claramente quando o tratamento deve ser interrompido, mas, de modo geral, é recomendável que se continue o tratamento por, no mínimo, um ano depois do desaparecimento dos sintomas. Mais recentemente, algumas drogas utilizadas para obesidade têm sido tentadas e vêm apresentando alguma eficácia na Compulsão Alimentar Periódica. É o caso da sibutramina, um agente antiobesidade, e o topiramato, um estabilizador do humor.

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